
A Comissão de Relações Exteriores (CRE) aprovou nesta terça-feira (9) um projeto que dificulta o retorno compulsório ao exterior de crianças vítimas de violência doméstica. A matéria recebeu um substitutivo (texto alternativo) da senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) e segue para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
O Projeto de Lei (PL) 565/2022, apresentado pela então deputada Celina Leão (DF), reconhece a violência doméstica como situação intolerável, que impõe grave risco físico e psíquico a crianças e adolescentes. Com isso, em processos de restituição internacional de crianças e adolescentes, quando um dos pais exige o retorno de um filho trazido pelo outro ao Brasil, a Justiça fica dispensada de determinar o retorno compulsório, caso seja comprovada a violência doméstica.
O texto acompanha a Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças e a Convenção Interamericana sobre a Restituição Internacional de Menores. Segundo os documentos, um país não é obrigado a ordenar o retorno se houver risco grave de a criança estiver sujeita a perigo de ordem física ou psíquica ou a situação intolerável.
Para Mara Gabrilli, situações de violência doméstica nem sempre são consideradas como circunstâncias capazes de caracterizar grave risco físico ou psíquico. Isso tem possibilitado o retorno compulsório de menores de idade a ambientes potencialmente inseguros.
— Na prática, o sistema internacional de cooperação jurídica, ao privilegiar a regra do retorno imediato ao país de residência habitual, por vezes minimiza a realidade concreta de mulheres, crianças e adolescentes submetidos à violência doméstica — argumenta a parlamentar.
A senadora cita como exemplo o caso da professora brasileira Eliana März, cuja filha de 12 anos, com síndrome de Down, foi obrigada a viver com o pai na Alemanha, mesmo diante de indícios numerosos de violência doméstica e negligência por parte dele. Em homenagem a essa mãe, a senadora propõe que a futura lei seja denominada Lei Eliana März.
Provas de violência
O substitutivo aprovado pela CRE estabelece os tipos de provas que podem ser admitidas pela Justiça. Entre elas:
- registros ou denúncias de violência física, sexual ou psicológica;
- medidas protetivas solicitadas no país estrangeiro, ainda que negadas, acompanhadas das alegações de defesa e das decisões administrativas ou judiciais que integraram o procedimento;
- laudos médicos ou psicológicos, elaborados no Brasil ou em país estrangeiro;
- relatórios de órgãos ou entidades de proteção, assistenciais ou equivalentes de país estrangeiro; ou
- relatórios de organizações da sociedade civil dedicadas à comunidade migrante ou serviços de apoio às vítimas de violência doméstica no exterior, com atuação destacada em âmbito internacional, nacional ou regional.
Direito a ser ouvido
Segundo o substitutivo, a criança ou adolescente tem direito a ser ouvido pela Justiça, por meio de escuta especializada ou por profissionais habilitados. O objetivo é subsidiar a tomada de decisão da autoridade brasileira a respeito do pedido de regresso ao país estrangeiro. De acordo com o texto, a ordem de retorno pode ser recusada caso se verifique oposição manifesta do menor de idade.
Para decidir sobre o retorno, o juiz deve se certificar se há mandado de prisão expedido contra o pai ou a mãe que retirou o menor de idade do país; se o pai ou a mãe perdeu o direito de residir no país estrangeiro devido à subtração da criança ou adolescente; e se existe risco de exposição da criança ou adolescente a danos físicos ou psicológicos no retorno ao país estrangeiro.
Crianças com deficiência
No caso de crianças ou adolescentes com deficiência, antes decidir sobre o retorno, a Justiça brasileira deve avaliar se há condições de reabilitação ou de tratamento de saúde adequado no país de residência habitual. Além disso, deve analisar se a separação do cuidador principal pode configurar grave risco físico ou psíquico.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)






